A pedido de um amigo, Emerson Lorensi, vai o texto abaixo. Um fábula dinâmica e viva, em que se pode enxergar a realidade de nosso contexto musical e social.
Hoje é um grande dia em uma árvore localizada em frente à uma fazenda de um poderoso coronel! Tudo isso por que era dia dos pequenos filhotes do casal de pássaros que ali se alojaram finalmente começarem suas tentativas de alçar voo e alcançar novos horizontes.
Enquanto a Mãe-Pássaro terminava de alimentar seus filhotes um por um, o Pássaro-Pai pousava quase que imponentemente no galho em que estava localizado seu ninho esperando a hora certa para começarem com o "ritual de iniciação"
Depois de finalmente alimentados e com energias de sobra, os filhotes estavam prontos para aprender a cruzar os céus e não mais serem dependentes de seus pais para comer.
O primeiro filhote parecia ser o mais promissor, pois muito antes dos outros já treinava suas asas e o alçar de seu voo, então o Pássaro -Pai, sem hesitar, começou por ele.
Posicionou-se a frente do filhote, com uma postura típica, tomou uma pequena distância e logo já estava no ar, dando meia volta para observar os passos do filho, que seguiu rigorosamente o que viu, porém, não obtendo o mesmo sucesso do pai, caindo em um galinheiro, o qual ja fazia parte da fazenda.
O Pássaro-Pai então, dirigiu-se até ele e o encorajou a continuar tentando, enquanto ele fazia o mesmo procedimento com os outros em cima do galho, quando duas galinhas se aproximaram do pequeno pássaro.
- Hey carinha, o que estava tentando fazer? Disse uma delas
-Tentando voar. Respondeu o pássaro
As duas galinhas se entreolharam e começaram a rir do pequeno aprendiz de voador.
-Do que vocês duas estão rindo? Indagou o filhote
-Bobinho, pra que aprender a voar, se o galinheiro nos oferece tudo? Aqui temos comida, água, lugar de repouso, companhia uma das outras... e nem precisamos mover uma asa para isso. Disse uma galinha
O jovem pássaro continuava a ouvir atento, enquanto seus irmãos, um a um, também falhavam e caiam no mesmo galinheiro, porém, sem desistir, não importando o número de fracassos, tentavam e tentavam cada vez mais.
- Olhe para seus irmãos, parecem patéticos caindo toda hora... pra que se sujeitar a isso? Fique aqui com agente e desfrute de uma vida boa, sem esforço nenhum. Disse a outra galinha.
Mal havia dito isso e os outros pássaros já estavam conseguindo alçar voo em uma altura razoável a ponto de ultrapassar os limites da cerca que separava o galinheiro da árvore.
-Veja, nem conseguem se manter no ar... e tudo isso pra nada... fique aqui conosco e desfrute de uma vida de rei, jovem pássaro.
Encerrou a galinha com um aceno positivo de cabeça, o pequeno pássaro se juntou as demais galinhas e cresceu, por muito tempo desfrutando da prometida vida de rei sem ter de mover uma asa para isso, enquanto seus irmãos viajaram o mundo inteiro com suas próprias asas, migrando de tempos em tempos por conta das mudanças climáticas, enfrentando predadores ferozes, alguns até sucumbindo diante das hostis condições da natureza e sua cadeia alimentar, mas a essa altura, o agora Pássaro crescido mal se lembrava de seus irmãos de espécie.E lá estão acomodados, até o dia em que a raposa invada o galinheiro."
Qual a moral dessa fábula? Calma, eu já chego lá.
O cenário musical do underground brasileiro é um retrato fiel da fábula acima (que por sinal não existe, acabei de inventar).
O "Galinheiro" é o cenário musical em si, comandado pelo "Coronel Fazendeiro", o dono da gravadora, que por sinal, não está nem ai para o galinheiro, pois o que lhe dá lucro mesmo é o seu "Abatedouro de Bois", que representa a cena mainstream atual brasileira (Restart e afins). As "Galinhas" são nada menos que as bandas covers que temos aos montes por ai que se contentam com o "milho" oferecido pelo galinheiro, sem pretensões de sair do mesmo com suas próprias forças e dar as caras ao mundo através de "suas próprias asas" ou seja, composições autorais, como fazem os "Pássaros" que representam as bandas independentes que fazem seu próprio som, enfrentando muitas dificuldades e muitas vezes sendo engolidas pelo mundo afora pelos "Predadores", pois na cadeia alimentar da indústria musical, o coronel decide que seus bois ficam por cima da carne em sua fazenda.
O autor do Texto, Enrique da banda Pink Dolls de São Paulo, mostra muito bem o cenário atual da música.
Mas, também podemos utilizar essa parábola, interessante, para mostrar a nossa juventude, não só enquanto artistas, mas também enquanto cidadãos. É mais fácil, ficar na internet do que assistir o jornal, que dormir, do que ler um livro. É mais fácil falar que político é tudo ladrão, do que pensar bem na escolha do voto, reclamar do aumento da passagem mas não sair as ruas reivindicando seus direitos. É isso mesmo que os “Coronéis” querem, ou seja, que aquelas pessoas que lucram com nosso alienação desejam. Pessoas que reclamam, mas trabalham para comprar a roupa da moda e o celular mais novo, mesmo que em muitas parcelas. Por que assim geramos lucro e perpetuamos esse sistema desigual. De que adianta não cair no chão, mas nunca experimentar a sensação de tirar os pés dele?
Músicos, estudantes, leitores, jovens, cidadãos. Perdei vossos medos, e lutais pelo o que realmente importa. Lutemos para o novo, mesmo que ariscado, por uma melhora, para que não nos acomodemos naquilo que nos impõem, como se nada nunca pudesse mudar.
Pode, e só depende de NÓS!
Thaesa Bacellar.